Ele apareceu no bar ontem.
Parecia um fantasma vindo à minha direção. Continua lindamente pálido. Sorriu me deu um beijo no rosto e um abraço desnecessário. Também achei desnecessário o beijinho de comadre, mas tanto faz.
Nunca o vi gesticulando daquele jeito. Falava baixo, quando sorria mostrava poucos dentes, usando quase sempre a mesma calça jeans. Puxou-me num canto e me disse com um arzinho confidencial que eu andava sumida, que sente saudades minhas e o caralho a quatro.
Mandei ele tomar no cu.
Sem histeria, sem despeito, sem nada. Parecia que eu tava dizendo bom dia pro caixa da lanchonete como eu faço toda manhã. Seco, rápido e objetivo.
Bom dia. Vai tomar no cu.
Voltei pro balcão e pedi uma dose de Whisky e me pus a pensar. Fazia tempo que eu não pensava nele. Achava até que eu tinha me esquecido dele. Quando eu o conheci ele tinha os cabelos compridos, lambidos e olhos assustados.
Naquela época rolava uma certa adrenalina da minha parte. Eu não tinha a mínima ideia de como seria. Eu não entendia os códigos. Era engraçado. Era bom. Eu tinha consciência. Mas era novo, diferente. E eu queria exatamente isso, ser surpreendida por sensações desconhecidas. Alcançar altos níveis de caos e intensidade. Não era rebeldia, nem perversão. Era curiosidade, prazer e loucura. Eu não me podava.
Eu gostava do jeito dele. Era aquele lance de admirar no outro o que a gente não tem coragem de ser, ou mostrar, sei lá. Essas merdas. Eu não sei se eu gostava dele ou do que a ideia de gostar dele me provocava. De qualquer maneira eu gostei e me fodi.
Não, ele nunca me fez nada. Eu me fodi sozinha porque minha cabeça é demente. Eu o mandei tomar no cu porque as pessoas mudam e ele não era mais ‘aquele’. Sei lá porque eu mandei ele tomar no cu. Acho que não gostei do cabelo.
#foda-se.